Por: Bento dos Santos.
Quando em Fevereiro de 1945, nos Estados Unidos da América se criou a Organização das Nações Unidas (ONU) perspectivou-se promover e concretizar os objectivos de materializar a paz nos distintos países espalhados pelo mundo.
A criação da ONU derivou assim de uma segunda tentativa de se criar a união das nações com o propósito de estabelecer relações amistosas entre os países, após o fracasso de uma primeira tentativa, então realizada com a formação da Liga das Nações, ao fim da Primeira Guerra Mundial.
Assim, as conferências de paz realizadas no final da Segunda Guerra Mundial possibilitaram que numa primeira fase cinquenta países, excluindo os que haviam feito parte do eixo, assinassem o tão importante documento.
No conteúdo da magna carta, destacam-se os compromissos mundiais como: Nós, os povos das Nações Unidas, decididos: a preservar as gerações vindouras do flâgelo da guerra que por duas vezes, no espaço de uma vida humana, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade; a reafirmar a nossa fé nos direitos fundamentais do homem, na dignidade e no valor da pessoa humana, na igualdade de direitos dos homens e das mulheres, assim como das nações, grandes e pequenas”, tendo como primeiro objectivo manter a paz e a segurança internacionais e para esse fim: tomar medidas colectivas eficazes para prevenir e afastar ameaças à paz e reprimir os atos de agressão, ou outra qualquer ruptura da paz e chegar, por meios pacíficos, e em conformidade com os princípios da justiça e do direito internacional, a um ajustamento ou solução das controvérsias ou situações internacionais que possam levar a uma perturbação da paz.
Infelizmente, após cerca de setenta e três anos (2018-1945) a propagação dos conflitos pelo mundo, dão-nos uma realidade diferente, onde se assistem cenários aterrorizantes perante a incapacidade de muitos governos mundiais não conseguirem honrar com a preservação do bem maior que é a vida, e continuamente assistimos e vivenciamos guerras por quase todos continentes. E pela Síria sabe-se que:
- A Rússia, aliada do presidente sírio Bashar al-Assad, opta pela acção diplomática e ao mesmo tempo envia regularmente armas à Síria.
- Os Estados Unidos, à frente da coalizão árabe-ocidental, realizam bombardeios contra o denominado Estado Islâmico (EI) no Iraque e na Síria, afirmando que tem tido êxito no combate aos grupos terroristas que operam na Síria.
- A França e Grã-Bretanha que até então mantinham posições neutras, pois negavam intervir na Síria para não favorecerem indirectamente o regime do presidente Bashar al-Assad, após várias cogitações da possibilidade de bombardearem a Síria viriam a efectivar tal pretensão, sob pretexto do estado Sírio ter feito o uso de armas químicas sobre o seu próprio povo.
- Num outro contexto, após o acordo sobre o seu programa nuclear, o Irã pode desempenhar um papel chave na solução do conflito sírio como interlocutor internacional dado o grau de influência que este país tem na região.
Mas como a Síria chegou ao estado que se encontra na actualidade?
A história recente do início do conflito Sírio começa com a propagação das ondas de protestos oriundas da primavera Árabe. Em março de 2011, a população síria saiu às ruas das cidades do país, pedindo o fim do regime político comandado por Bashar Al-Assad. A não aceitação das reivindicações e a repressão efectuada pelas forças militares de Al-Assad aumentaram as tensões políticas, levando a oposição a empreender uma luta armada contra o governo.
Bashar Al-Assad chegou ao poder no ano 2000, após a morte do seu pai, Hafez al-Assad, que havia iniciado seu comando no país durante a década de 1970. Os dois representam os alauítas na Síria, uma minoria que professa o islamismo e compõe cerca de 10% da população. A organização política que sustenta o poder dos Al-Assad é o partido Baath, a renascença, que tem como parte de sua doutrina o nacionalismo árabe e o anti-imperialismo. Essa postura levou o país a se opor às políticas dos EUA no Oriente Médio, como também às acções do Estado de Israel, país que havia tomado do estado sírio as colinas de Golã, em 1967, durante a Guerra dos Seis Dias.
Assim sendo, Bashar Al-Assad pretendeu que o seu governo inicia-se a implementação das medidas de abertura política, como a libertação de presos políticos; mas tais medidas se mostraram muito limitadas. Com a manutenção de limitações à participação política da população, os eventos da Primavera Árabe insuflaram ainda mais as acções da oposição ao regime. Assim a luta iniciou sob pretextos dos direitos da autodeterminação do povo sírio. Porém, os desdobramentos dos conflitos militares entre as forças da oposição e as forças militares do governo de Al-Assad passaram a envolver uma série de países, com interesses na Síria e no Oriente Médio.
Os países ocidentais, principalmente os EUA, França e Reino Unido, declararam apoio às forças de oposição, denominadas pela imprensa de forças rebeldes. O governo dos EUA inclusive chegou a reconhecer, em dezembro de 2012, a CNSOFR como representante legítima da Síria, pretendendo deslegitimar o governo de Al-Assad, e criou ainda o Grupo de Apoio Sírio (Syrian Support Group, SSG, em inglês), uma entidade destinada a angariar recursos financeiros e apoio não letal para apoiar o Exército Livre Sírio (ELS), a principal organização da CNSOFR. O ELS foi formado principalmente por desertores das Forças Armadas Sírias, que passaram para a oposição ao regime.
Existe também uma coalização forças ligadas a grupos islâmicos, cujos guerreiros, os mujahidin, estariam combater pelo jihad, a guerra santa muçulmana. Entenda-se que os grupos islâmicos estão organizados na Frente Síria de Libertação Islâmica, próximos à Irmandade Muçulmana; a Frente Islâmica Síria, que defende a instalação de um Estado teocrático no país. Todavia, além dos EUA, apoiam os opositores sírios de Al-Assad a Turquia, Reino Unido, França, Arábia Saudita, Qatar e Israel. O apoio desses países acontece de várias formas, principalmente através do envio de armas e na facilidade de transporte delas através das fronteiras.
Porém, tal como ocorreu com os demais países que tiveram manifestações da Primavera Árabe na Síria também se identifica a interferência de outros países, o que vem a tornar ainda mais complexo o processo que visa por fim ao conflito. E para nos lembrarmos, temos em mente que foi o apoio das forças ocidentais que levaram à queda do então presidente líbio Gadaffi.
Entretanto, apesar do isolamento do governo sírio, fortalecido após o apoio dado ao grupo islâmico libanês Hezbollah, em 2008, Al-Assad tem sido defendido pela Rússia, China, além do Irã, Líbano e Iraque.
Contudo, a busca para comprovar o uso de armas químicas, com gás sarín, por parte do exército de Al-Assad, não é propriamente um assunto novo por parte dos governos ocidentais. Em 21 de agosto de 2013, o governo do presidente americano Barack Obama tentou justificar um ataque aéreo à Síria tendo como fundamentação os mesmos argumentos que hoje se repetem, sem no entanto haver a comprovação de tais factos.
Tirando as suposições, até o momento não existem provas concretas que permitem acusar o governante sírio de crime contra a humanidade, mas esta parece ser a única forma de obter o aval da maioria dos países da ONU para o ataque à Síria.
Segundo o alto-comissário das Nações Unidas para Refugiados, Filippo Grandi, "os confrontos armados na Siria forçaram cerca de 5,6 milhões de pessoas a deixar o país em busca de segurança. Outras 500 mil tiveram de abandonar suas casas e vivem como deslocadas forçadas dentro do território sírio".
As condições de vida dos civis dentro da Síria são piores do que nunca, com 69% da população vivendo na pobreza extrema. O número de famílias que gastam mais da metade da sua renda anual com comida aumentou para 90%. Os preços dos alimentos são, em média, oito vezes mais altos do que os níveis anteriores à crise.
A maioria dos refugiados sírios em países vizinhos vive abaixo da linha da pobreza. Mais de três quartos dos refugiados nas áreas urbanas da Jordânia e do Líbano são incapazes de suprir suas necessidades básicas de alimentação, moradia, saúde e educação.
A proporção de crianças refugiadas na escola aumentou nos últimos anos. No entanto, 43% do 1,7 milhão de refugiados sírios em idade escolar não frequentam um centro de ensino. Os sistemas nacionais de educação pública nos países de acolhimento estão tendo de criar segundos turnos para acomodar estudantes sírios e precisam de mais apoio.
No meio de tanto choque para a emancipação do poder, o que não se diz sobre o conflito Sírio, é que a Síria parece ter tido o azar de ser escolhido como o campo do espetáculo para se travar a então ascensão da Rússia, no que diz respeito a recuperação da sua posição de potência hegemônica no contexto das super potenciais mundiais.
O desejo do presidente Vladimir Putin levar a solução do conflito Sírio pelas vias diplomáticas não tem tido sucesso, pois o real interesse dos países ocidentais não parece estar alineado a paz. É precisamente sob este manto escuro, que se intensifica a cada dia, que se anula a possibilidade da resolução do conflito Sírio.
Actualmente, passados cerca de sete (2018-2011) anos desde o início e vigência do conflito na Síria, podemos concluir que o conflito Sírio revela mais uma vez fragilidade da Organização das Nações Unidas no que diz respeito aos temas ligados a resolução de conflitos, considerando que para a resolução de conflitos os Estados podem adoptar
três formas básicas: persuasão, dissuasão e coerção. O que se constatou no caso Sírio foi a implementação da coerção no seu último estágio, com a realização da guerra no campo das operações, e dela hoje o povo Sírio vive as suas implicações e consequências. Razão para se reflectir se já não é tempo de se rever as estratégias para resolução de conflitos que são formuladas na ONU (...).
Até lá, a infeliz realidade reside no permanente fracasso que se mantém, dada a continuidade do conflito!
domingo, 22 de abril de 2018
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